UMA FORÇA PARA O BEM – A visão do Dalai Lama para o nosso mundo
CULTIVANDO O EQUILÍBRIO EMOCIONAL
A Prisão Estadual de Soledad, com suas fileiras de prédios sombrios e monótonos, rodeados por concertinas de arame laminado, parece deslocada em meio às fazendas verdejantes de um belo vale próximo à baía de Monterey, na Califórnia. As tensões às vezes se transformam em rebeliões. Muitos prisioneiros, e até mesmo guardas, foram apunhalados com lâminas improvisadas.
Eve Ekman, assistente social voltada para a área médica, esteve na prisão para compartilhar o programa CEB com sessenta prisioneiros.
Ron, que já estava na prisão havia quarenta anos, contou que há pouco tempo soube que finalmente seria posto em liberdade condicional. Ele descreveu as ondas de alegria, excitação e gratidão que se espalharam para os amigos da prisão e a família do lado de fora ao lhes contar a boa-nova.
No entanto, duas semanas depois, Ron ficou sabendo que a condicional havia sido negada. Arrasado, ele mergulhou em um profundo sentimento de impotência, seguido por ondas de tristeza e, depois, raiva. Ron ficou tenso, agitado e retraído, evitando qualquer contato de forma agressiva.
Quando Eve pediu a Ron que mapeasse as emoções em uma linha do tempo, ele percebeu que, depois de a raiva passar, buscou socorro emocional nos colegas de prisão. Visto por todos como um mentor, ele descobriu que todos o apoiavam. Enquanto Ron contava a história, alguns dos sessenta participantes o elogiaram, dizendo que ele era um “sujeito durão”.
À medida que a sessão avançou, surgiu uma história comum a muitos prisioneiros, que falavam da sensação de nunca terem sido amados, cuidados, e de jamais terem se conectado a alguém, para depois encontrar consolo nas drogas e levar uma vida plena de medo, raiva e sofrimento. “A raiva”, observou Eve, “era mais segura de se explorar do que a tristeza. A raiva foi a maneira que encontraram para fugir da tristeza.”
Fazer uma linha do tempo das emoções permitiu aos prisioneiros se afastar do turbilhão emocional e ver que não precisavam ficar eternamente reféns de sentimentos opressivos. O mapa das emoções também ajudou a fazer essa classificação, além de alguns conceitos científicos básicos sobre as famílias de emoções.
A ideia que realmente abriu os olhos dos prisioneiros, no entanto, foi que, embora possam ser destrutivas e causar sofrimento, as emoções também podem gerar sentimentos construtivos. Eve deu o exemplo de como a raiva bem canalizada pode se tornar o combustível para protestos contra injustiças ou condições intoleráveis. Essa ideia, disse um deles, se alastraria como fogo em mato seco dentro da prisão.
Eve e o colega que a acompanhava se surpreenderam ao descobrir que, logo no primeiro encontro, prisioneiros endurecidos pela vida — muitos com mais de cinquenta anos — se mostraram abertos a falar sobre problemas emocionais e que, como Ron, grande parte deles dedicou muito tempo a refletir sobre a própria vida.
Práticas de contemplação guiada forneceram ferramentas para os prisioneiros administrarem melhor seus mundos internos. Em uma dessas práticas, eles fizeram quatro perguntas a si mesmos:
Para mim, o que seria atingir a verdadeira felicidade?
O que o mundo precisa me dar para que eu consiga isso?
O que eu preciso fazer — que hábitos preciso aprender?
Por fim: como posso levar isso ao mundo de forma útil?
Em outra prática, os prisioneiros aprenderam a se acalmar ao se concentrarem nas sensações da respiração — e a descansar em um refúgio interno, sem ficarem presos ao passado ou preocupados com o futuro.
Essa orientação para o presente foi libertadora para muitos, especialmente após revelarem seus difíceis arrependimentos do passado. “Não dá para mudar o que já aconteceu”, disse Eve, “mas vocês podem usar cada momento para definir uma nova motivação, uma nova aspiração.”
No fechamento da sessão, os prisioneiros desejaram, em silêncio, o melhor a todos os presentes — e a si mesmos.
A vida nos dá tanto um termômetro de nosso progresso quanto nossa prova final.
Em nossa conversa, Eve Ekman me disse que planejava voltar a Soledad para treinar três prisioneiros, preparando-os para ensinar o CEB a quem estivesse interessado.
O CEB se inspira em alguns pontos que o Dalai Lama enfatiza para domar nossos impulsos emocionais destrutivos: um entendimento científico das emoções e métodos contemplativos que fornecem ferramentas para uma reação mais tranquila a situações tensas. “Um de nossos objetivos é permitir que as pessoas percebam que é possível cultivar uma sensação de tranquilidade”, explicou Eve.
Outro ponto igualmente importante é refletir sobre a preocupação com os outros e cultivá-la. Ficar mais tranquilo e ter o pensamento claro contribuem enormemente para nosso bem-estar, mas apenas essas atitudes não são garantia de que usaremos tais habilidades para servir a uma força para o bem.
Para isso, é preciso algo mais: uma bússola moral.
Extraído de Goleman, Daniel – “Uma Força para o Bem – A visão do Dalai Lama para o nosso mundo”, Editora Objetiva.